Divórcio extrajudicial: Eficiência jurídica na dissolução consensual do casamento
O encerramento de um casamento, embora marcado por decisões pessoais delicadas, pode ser juridicamente simples, seguro e célere quando realizado de forma consensual. O ordenamento jurídico brasileiro permite que o divórcio consensual seja realizado diretamente em cartório, sem a intervenção do Poder Judiciário, desde que preenchidos certos requisitos legais. Trata-se do divórcio extrajudicial, expressão moderna da autonomia privada e da desjudicialização das relações civis.
A consolidação do divórcio extrajudicial representa uma significativa evolução no tratamento jurídico das relações conjugais. Ao reconhecer a legitimidade da vontade conjunta dos cônjuges e permitir a dissolução do vínculo sem a necessidade de judicialização, o sistema privilegia soluções consensuais, otimiza recursos públicos e promove maior eficiência na prestação jurisdicional indireta. Trata-se de uma alternativa que alia simplicidade procedimental à segurança jurídica, assegurando às partes um processo menos desgastante e mais compatível com a realidade social contemporânea.
Requisitos legais para realização do divórcio extrajudicial
O divórcio extrajudicial foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela lei 11.441/07, que foi posteriormente complementada e consolidada pelo CPC/15, que incorporou esse conteúdo no art. 7331, que autorizou a lavratura de escritura pública de divórcio, separação e partilha de bens consensuais diretamente nos cartórios de notas.
Para que o procedimento de divórcio extrajudicial possa ser realizado, é necessário o cumprimento de alguns requisitos:
- Consentimento mútuo dos cônjuges: A via extrajudicial só é admitida quando há plena concordância entre as partes sobre a decisão de se divorciar e sobre os termos do rompimento – como partilha de bens, alimentos e eventual alteração do nome. Qualquer divergência sobre esses pontos inviabiliza a escritura e exige a judicialização da demanda;
- Ausência de filhos menores de idade ou incapazes: A presença de filhos menores ou incapazes impõe a tutela do Estado sobre os seus interesses, que são indisponíveis. Por isso, nesses casos, o Ministério Público deve ser ouvido, o que exige o ajuizamento da ação judicial. Contudo, se os filhos forem maiores e capazes, mesmo que economicamente dependentes, o divórcio poderá seguir pela via administrativa;
- Presença obrigatória de advogado: A presença de um advogado é condição de validade do ato, sendo este o profissional responsável por garantir que os direitos das partes estejam preservados. Pode-se nomear um advogado comum ao casal ou advogados distintos;
- Capacidade civil plena dos envolvidos: Pessoas interditadas, com deficiência intelectual que comprometa sua autonomia, ou em qualquer condição que limite sua capacidade de manifestar vontade, não podem optar pela via extrajudicial. Isso porque a presença de incapaz exige curatela e intervenção judicial.
Além desses requisitos, a documentação deve estar completa e atualizada: certidão de casamento, documentos pessoais, certidão de bens, pacto antenupcial (se houver), e comprovantes relacionados à partilha.
Caso qualquer desses requisitos não seja atendido, o tabelião deve se recusar a lavrar a escritura e orientar as partes a buscarem o Poder Judiciário. Por outro lado, quando todas as exigências são observadas, a escritura pública de divórcio produz efeitos imediatos e pode ser utilizada para todos os fins legais: averbação da certidão de casamento, atualização de registros patrimoniais e alterações cadastrais perante órgãos públicos e privados.
Procedimento no cartório de notas
O procedimento do divórcio extrajudicial tem início com a escolha do Tabelionato de Notas, ao qual caberá lavrar a escritura pública que formalizará a dissolução do casamento. A legislação não exige que o cartório esteja localizado no domicílio dos cônjuges ou no local onde foi celebrado o casamento, o que oferece ampla liberdade de escolha às partes. Opta-se, em regra, por cartórios com melhor reputação, maior agilidade ou que disponham de serviços digitais, especialmente em grandes centros urbanos.
Para iniciar o processo, os cônjuges – por si ou por meio de seus advogados – devem agendar atendimento no cartório e apresentar toda a documentação necessária. Isso inclui a certidão de casamento atualizada (emitida há menos de 90 dias), documentos de identificação pessoal, pacto antenupcial (caso exista), certidões dos bens a serem partilhados (como matrículas de imóveis, documentos de veículos e extratos financeiros), além de comprovantes de quitação fiscal, quando aplicável. A presença de advogado é obrigatória e sua qualificação constará da escritura – podendo representar ambas as partes ou atuar separadamente.
Com os documentos em mãos e todos os termos acordados, será redigida a minuta da escritura pública. Esta deve conter cláusulas claras e detalhadas sobre a vontade de dissolver o vínculo conjugal, a forma de partilha dos bens, a decisão sobre a manutenção ou retorno ao nome de solteiro, bem como a definição de responsabilidade pelas custas e tributos incidentes. Caso os cônjuges optem por não realizar a partilha de imediato, essa intenção também deve constar expressamente na escritura, a fim de evitar alegações de omissão ou nulidade futura.
O tabelião exerce função de controle formal e legalidade, verificando se os requisitos legais foram atendidos e se não há elementos que demandem intervenção judicial – como dúvidas sobre a capacidade das partes, ausência de consenso ou irregularidade na documentação. O profissional também poderá esclarecer dúvidas das partes, embora sua atuação não substitua a assessoria jurídica do advogado.
Concluída a conferência, a escritura é lavrada e assinada pelos cônjuges, seus advogados e, quando necessário, por procuradores.
A escritura pública de divórcio possui eficácia imediata, mas seus efeitos perante terceiros dependem da devida averbação no Cartório de Registro Civil, no assento de casamento, que deve ser providenciada por iniciativa dos cônjuges. Além disso, quando há partilha de bens, é indispensável a averbação nas matrículas dos imóveis junto ao registro de imóveis, a transferência de propriedade de veículos junto aos órgãos de trânsito e, eventualmente, a comunicação aos bancos, instituições financeiras, Receita Federal e demais entes públicos e privados, conforme a natureza dos bens.
O prazo para conclusão do procedimento dependerá da complexidade do caso e da completude da documentação apresentada, mas em geral a escritura pode ser lavrada em dois a cinco dias úteis. Em situações mais complexas – como partilhas com bens de alto valor ou múltiplas propriedades – pode haver necessidade de diligências complementares, inclusive orientação fiscal para definição de ITBI, ITCMD ou necessidade de retificações patrimoniais anteriores.
Os custos envolvidos incluem os emolumentos cartorários, fixados por tabelas estaduais, que variam conforme o valor dos bens partilhados e o número de páginas do ato, além dos honorários do(s) advogado(s) e possíveis tributos sobre a transferência de bens. Em alguns casos, como partilhas desiguais ou transmissões onerosas, pode haver exigência prévia de recolhimento de tributos antes da lavratura.
Por fim, cabe destacar que, apesar da informalidade relativa do ambiente cartorário, o procedimento exige atenção técnica apurada. A atuação diligente do advogado é crucial para garantir a validade do ato, evitar cláusulas mal redigidas, prever consequências patrimoniais e preservar direitos futuros. O divórcio extrajudicial é um caminho eficaz, mas requer planejamento, estratégia e acompanhamento jurídico responsável.
Vantagens do divórcio extrajudicial
O divórcio extrajudicial consolidou-se como uma alternativa moderna e eficiente à via judicial, especialmente em contextos de consenso e ausência de litígio. Suas vantagens decorrem da combinação entre celeridade procedimental, redução de formalismos e plena eficácia jurídica do ato, desde que respeitados os requisitos legais.
A principal vantagem está na rapidez da tramitação. Diferentemente do processo judicial, que pode se estender por meses ou anos – mesmo nos casos consensuais -, o divórcio em cartório pode ser concluído em poucos dias, desde que a documentação esteja completa e os termos estejam definidos entre as partes.
Outro aspecto relevante é a economia de tempo e recursos financeiros. A desnecessidade de petições, audiências e intervenção judicial reduz significativamente os custos do procedimento, restringindo-se aos emolumentos cartorários, aos honorários advocatícios e, eventualmente, à tributação incidente sobre a partilha de bens. Essa estrutura simplificada torna o processo mais acessível para muitos casais, sem comprometer a segurança jurídica.
Do ponto de vista jurídico, a segurança e eficácia da escritura pública são plenamente reconhecidas. A escritura tem natureza de título executivo extrajudicial, possui os mesmos efeitos de uma sentença judicial e serve para todos os fins legais, inclusive para averbações, registros e modificações cadastrais. Além disso, o ato é fiscalizado pelo tabelião, que atua como garantidor da legalidade formal.
Em síntese, o divórcio extrajudicial representa um modelo mais leve, eficiente e humanizado de gestão do fim do vínculo conjugal. Ao permitir que as partes exerçam sua autonomia com apoio jurídico qualificado, reduz-se a litigiosidade, promove-se o acesso à justiça e valoriza-se a autocomposição como instrumento legítimo de reorganização da vida civil.
Considerações finais
O divórcio extrajudicial representa um avanço normativo e institucional, ao permitir que o fim do casamento consensual se dê com celeridade, segurança e autonomia das partes.
Apesar da simplicidade do procedimento, a presença do advogado é essencial para assegurar que todos os aspectos legais sejam devidamente observados, garantindo segurança jurídica, validade do ato e prevenção de litígios futuros.
Trata-se, portanto, de uma alternativa moderna e eficaz, que alia técnica jurídica, autonomia privada e respeito à dignidade das partes envolvidas no fim de uma relação conjugal.
________
1 Art. 733. O divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual da união estável, quando não houver nascituro ou filho incapaz, poderão ser realizados por escritura pública, independentemente de homologação judicial.
https://www.migalhas.com.br/depeso/429806/divorcio-extrajudicial-eficiencia-na-dissolucao-conjunta-do-casamento
Deixe uma resposta
Quer juntar-se a discussão?Fique à vontade para comentar!